sábado, 1 de maio de 2010

A espera


Sentada em um bar numa noite de sexta feira no rio de Janeiro, vi, do outro lado da rua, em outro bar, o homem da minha vida. Ele não me viu! Antes que pudesse me ver, levantou e foi embora. E eu, tão perto e tão distante, o vi se afastar e sumir na esquina de uma rua qualquer de Botafogo.

Na mesa ao lado, vizinho do mesmo bar, estava um mineiro, arquiteto, óculos de grau e mochilinha da Nike. Me olhava e tentava se aproximar. Me olhava e olhava Paula. Paula conversava e falava coisas de amor e tinha o coração apertado. Paula esperava notícias de São Paulo, e eu, tinha acabado de deixar São Paulo pra trás.
O vizinho ouvia nossa conversa e fingia que não ouvia, esperava e esperava alguma brecha, alguma “deixa” onde ele pudesse entrar. Eu esperava que não conseguisse, esperava que não se aproximasse e esperava que o homem da minha vida voltasse e aos meus pés se ajoelhasse. Esperava.

Eu esperava, Paula esperava e o vizinho esperava.

Uma terceira pessoa chegou. Uma pessoa do passado de Paula e do presente do vizinho. Homem de épocas de play e de salada mista, onde coisas sérias eram brincadeiras e descobertas. Um garoto perdido pelos anos como história pra contar com início, meio e sem fim... Até essa noite comum, naquela rua qualquer, em um bar de Botafogo.

Chegou aquele, direto do túnel do tempo, que ligou três pessoas num bar, aquele que acabou com a espera de Paula, quando tinha 16 anos, aquele que acabou com a espera do vizinho por uma brecha pra se aproximar. Naquela noite qualquer... Poderia ser qualquer outro, mas foi ele quem chegou... Uma daquelas conexões do universo, onde não se encontra lógica, onde não se explica nada.

A gente sempre espera alguma coisa. As esperas se transformam e caminham em círculos espirais, porque algum detalhe sempre muda. Algumas vezes esperamos coisas que não deveríamos esperar. O vizinho terminou a noite arrependido de esperar se chegar.

A espera de Paula por notícias de São Paulo, virou uma espera pela lua em outro lugar. Essa espera acabou quando encontraram a lua iluminando o cristo em um apartamento, no alto de um prédio em outro ponto de Botafogo. Hoje Paula espera notícias desse mesmo lugar.

E eu, como escrevo esse texto, posso esperar o que quiser... Espero o verão chegar. Espero aquele homem voltar.

Eis o acontecido, eis a espera do outro lado da rua:

Estava o senhor K. Sentado em um bar, numa noite de sexta feira com um amigo do trabalho. Tinha os cabelos negros e uma barba grisalha. Bebia e fumava como se fosse uma noite qualquer.

Passou os olhos sem interesse, entre uma frase e outra, pelos bares ao redor, sem esperar nada, apenas como um ato natural de quem fala coisas de bar. Seu olhar se detém ao ver a mulher da sua vida, aquela pela qual havia passado esperando, até aquela noite vulgar.

Naquela noite, que seria mais uma noite qualquer, ele sentiu que uma de suas esperas havia chegado ao fim e sua respiração se prendeu naquela imagem. Um terror enorme lhe invadiu a alma; algumas esperas são perigosas quando chegam ao fim.

Sr. K. esperou o tempo necessário pra tomar uma decisão (aqueles momentos cruciais em que fazemos nossas escolhas e delas se define todas as nossas esperas futuras). K. continua esperando... Esperando decidir alguma coisa, mas sente que seu corpo paralisa diante do inesperado... Inesperado, mas que, numa contradição louca (como é a vida), se trata de algo tão esperado, por tanto tempo, esperado e sonhado desde que Sr. K. se entendeu como um ser que sonha, um ser que espera.

E, agora, sentado na mesa de um bar comum, naquela sexta feira, K. espera decidir ir ao encontro daquela espera de anos, daquela fantasia.

Então, ele pede a conta, e a espera da conta é mais suportável do que a espera da aproximação no bar da frente. K. respira aliviado por poder esperar outra coisa, por poder adiar o fim da espera anterior.

Quando a conta chega e a espera chega ao fim. K. se esquece da espera anterior e, sem saber, faz sua escolha. A fantasia ganha, e algumas nunca devem deixar de ser o que estão destinadas a ser: esperas eternas.

E eu, do outro lado da rua, vejo o Sr. K. (aquele que estava destinado a ser o homem da minha vida) que se levanta e caminha de costas se afastando e sumindo na esquina torta da vida... E passo o resto da noite esperando que ele volte... Mas, por hora, espero apenas a conta chegar.

3 comentários:

Maria Inez do Espirito Santo disse...

Muito bom, Jana!
Adorei!

Anônimo disse...

Adorei, Jana!
Todas as esperas da nossa vida... E a paciência não é exatamente a minha maior virtude...rsss

Beijos!
Deb.

Jana disse...

A nossa deb!!