domingo, 27 de junho de 2010

castelos de areia


Em busca de um atalho, de um beco escuro que me tire da realidade: Esta é uma, e de repente não é mais a mesma.
Busco alguma coisa que entorpeça a dureza do mundo, do meu mundo: Que muda e se transforma com a rapidez de luzes coloridas dentro de uma noite escura.
Uma boate tocada por um DJ ruim, que muda bruscamente a música... Tento dançar, acompanhar, me adequar à sua loucura... Que é a minha.
O que será que é tudo isso? O que tudo isso representa?
Fujo de perguntas que abrirão portas obscuras do significado da vida... Desde que existe consciência o homem se faz as mesmas perguntas.
Busco a fuga em respostas que me tragam uma paz passageira, pois as perguntas só ficam no ar esperando pra baixar.
Queria ser outra pessoa, mais simples, mais “deixa rolar”... E o maior paradoxo é que acredito que possa ser quem eu quiser... Mas não posso.
E me pergunto quem sou... E acho que sei quem sou... E não sou nada do que era ontem.
Quando me surpreendo construindo castelos de areias que se desmoronam da noite pro dia... Pra construir novos palácios. Seguindo de areia em ar, de sonhos em fantasias.
Me agarrando em coisas mutáveis, escalando muros que darão em nada, em lugar nenhum, num vazio ensurdecedor dessas luzes e músicas desconexas.
Grito sem voz, música sem acompanhamento, teatro sem platéia, dança sem par.
Busco um Deus que ora existe, ora não. Um maestro que afine essa orquestra indisciplinada que insiste em tocar.
Algumas vezes me sinto tão perto dele que acho que o posso tocar.
Outras tão distante que só me resta voar.
As minhas certezas já não são tão certas e as buscas exaustivas.
Não me sinto parte desse mundo, ou de outro qualquer, não tenho idéia do meu lugar.
Caminho por corredores escuros e labirintos do meu próprio ser e não me sinto vencedora na domesticação das minhas feras... Não sei se vou passar de ano nessa vida.
E talvez esse vazio e esse sentimento de impotência e o obscuro da vida façam parte do caminhar da humanidade e acompanhem a consciência desde que o homem é homem e o mundo é cada mundo somado em um só e não um só dividido em tantos.
Cada individualidade responde pelas suas interpretações e construções de uma realidade tão própria... E tomo as dores de todos e sinto as minhas dores tanto e sigo buscando e caminhando.
Talvez a vida seja isso: realidades paralelas, castelos de areias, perguntas sem resposta... Dança sem par.
Solos que se juntam formando a dança da vida... Alguns se sintonizam por um tempo... Grupos se agrupam por alguns instantes... E se afastam... E seguimos nos nossos solos. Alguns seguem a música, alguns dançam junto músicas diferentes, alguns não dançam música alguma.
E como não há resposta e sempre há perguntas, busco substâncias que entorpeçam meus questionamentos e veículos que descarreguem minhas angustias.
Mesmo assim escolho a vida que vale a pena ser vivida. E escolho meus castelos, lindos, até o próximo sopro.
E é como eu sempre digo: ciclos e espirais que se repetem, já que o círculo da vida não é redondo.
E espero que haja um Deus, e espero que eu passe de ano nessa escola... Que eu sobreviva a mim mesma nessa vida.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Por que não o vermelho?

E foi assim...

João nasceu num mundo onde só se podia gostar do azul. Desde pequeno se sentia atraído pelo vermelho e era constantemente reprimido por seus pais.

João começou a negar o vermelho, fazia de tudo pra gostar do azul, algumas vezes até chegou a acreditar que seria como os outros... Mas o vermelho o perseguia, sempre cruzava seu caminho, parecia obsessão. Sua atração era cada vez maior e mais incontrolável. Quanto mais lutava contra ela, mais ela crescia.

João cresceu nesse mundo azul e passou a adorar o vermelho, escondido, em segredo. Seus armários eram revestidos de um veludo avermelhado, pelas ruas andava vestido de azul, mas em casa dormia em vermelho. Falava azul e sonhava vermelho.

João procurava em livros e em terapias o motivo de seu "distúrbio". Uma explicação, alguém que lhe desse uma luz sobre o que acontecia com ele. Passou anos lendo e relendo estudos científicos, teses e palpites, mas nunca encontrava uma explicação plausível pro seu problema...

Qual sociedade está preparada pra aceitar o não aceito?

Por que será que estamos condicionados a acreditar que homem gosta de mulher e mulher de homem? Será que tem relação com a mera reprodução da espécie? Não é tão simples entender que cada um gosta do que quiser?

João passou anos da sua vida achando que era uma aberração, só porque gostava de vermelho. Viveu uma vida dupla e nunca conseguiu viver plenamente a sua juventude e curtir e namorar e viver o que tinha vontade de viver. É necessário que jovens passem por esse sofrimento todo, tentando se adequar às exigências, ao que se espera que eles sejam, façam ou gostem?

Quando uma criança nasce ela pode ser destra ou canhota, imagina se a mãe força o filho a usar a direita porque "é aceito". Cada vez que a criancinha pega a colher com a esquerda, a mãe vai lá e põem na direita. Agora imagina que cada vez que ela faz isso ela diz: "Feio!"...

E se na nossa sociedade fosse natural o sexo entre pessoas do mesmo sexo e a reprodução tivesse uma conotação de amizade, independente das relações? As pessoas se relacionariam e em determinado momento se juntariam por afinidades outras, apenas com o objetivo de procriar. Talvez fosse muito mais simples, já que não haveria divórcio e nem conflitos de relacionamento durante a criação dos filhos. Amigos se unindo pra terem filhos juntos, cada um com seus amantes do mesmo sexo. Seria tão absurdo pensar isso? Não seria apenas uma questão cultural?

Se assim fosse, eu, que sou mulher e gosto de homens, seria uma "errada" nessa sociedade. Provavelmente estaria casada com uma mulher, como “manda o figurino”, e estaria infeliz. Ou estaria com um homem, em segredo, vivendo carregada de culpa e medo de que descobrissem a minha outra identidade.

Tudo por paradigmas, tudo porque não abrimos a nossa cabeça e não aceitamos o diferente como sendo apenas diferente, e não: certo ou errado.

domingo, 13 de junho de 2010

O fim

E tudo caminha pro mesmo fim.

O mesmo roteiro, aquela estória fantástica que agradou ao público.

Sabe aquele filme campeão de bilheteria? A mesma fórmula.

Termina e recomeça a mesma história, o mesmo início, o mesmo meio, o mesmo fim.

Já começo a pensar que não escrevo a minha vida, que ela é uma sucessão de repetições.

E recomeço do começo e caminho pelo mesmo destino.

Falta inteligência ou sobra teimosia.

Se esse filme já vi... Já sei onde vai dar.

Mas assisto de novo e novamente até o fim, e não acredito que o fim é o mesmo, e sempre, a mesma coisa.

O pior é que eu acho mesmo que o final mudará, que cada vez é diferente.

E, assim, repito o mesmo filme, como uma droga, como em uma crise de abstinência.

Mesmo assim, sendo como for, pago pra ver até o fim e não acredito quando ele chega...

E ele sempre chega!

Assim que o começo recomeça, caminho pelo meio e o fim não tarda.

Fecho o filme pra recomeçar o mesmo. Repetindo...

Paralisada na mesma história... Repetindo... E não mudo.

Acho que me acomodei num fim conhecido, mas não penso assim no começo.

Se eu conseguisse pensar assim, certo, talvez pudesse mudar esse roteiro, virar a página, sair desse ciclo de expirais de repetições eternas.

Mas penso como sempre pensei em todos os começos daquele mesmo filme: "Que tudo pode ser diferente."

Uma pequena mudança, um simples pensamento novo, pode mudar um grau a minha navegação e me levar pra outro continente...

Mas esse seria outro filme, e ainda não assisti tantas vezes, quantas vezes, o suficiente... Ainda acredito que ele não é ele e que pode ser diferente... Repetindo, repetindo, repetidamente.

Talvez seja falta de inteligência ou excesso de teimosia.

Ainda não aprendi o que preciso aprender com esse filme, esse mesmo filme de tantos anos. Será possível isso de novo?

Pelo menos ao final escrevo coisas sobre esse fim, e começo... A pensar se o verei novamente.

E sei que, já, já, o recomeço e a esperança voltam, junto com o fim da lembrança, recomeçando novamente o esquecimento desse fim que vivo hoje.

E o início e o meio justificam o fim, assim como o fim justifica esse texto.

E talvez esteja tudo certo, tudo justo e perfeito no universo.

E chego ao fim desse texto sem um fim próprio, apenas selando essa repetição com um ponto final.

Crucial e banal... Mas um fim... Mais um fim, pra talvez recomeçar de um mesmo começo...

Acho que perdi a noção do meu tamanho

Acho que perdi a noção do meu tamanho.

Acho que eu nunca soube o espaço que ocupo...

Onde eu termino e o outro começa.

Sempre permiti invasões de todos os lados, em todas as áreas,
de todo canto...

E me arrependo de ir até o fim... Também me arrependo de não ir.

Acho que o mundo anda sem noção de espaço.

Acho que as pessoas se perderam em limites,
até onde podemos ir sem agredir?

Até que ponto o outro corresponde ao nosso desejo sem exigir nada em troca?

Barateamos demais, por migalhas de atenção.

...E ele acha que vou quando quer...
Descobre que vou quando eu quero...
Ou eu descubro que vou quando ele quer.
...E acho que vou quando eu quero.

ou não vou...

Às vezes me arrependo de ir, mas vou pra não me arrepender de ficar.

Acho que não te deram educação
ou eu te eduquei muito mal,

Acho que não sei o meu valor e não te ensinei a me valorizar.

Acho que vc não leu nosso contrato.

Acho que não fiz contrato com vc...
Mas deveria fazer!

Deveria fazer um contrato comigo e saber, de uma vez por todas, que não estou à venda, que não sou solta, que não é só chamar pra me ter.

E digo "não" quando vc quer, e, no fundo, digo sim.

Mas vc não me lê, não me entende. Eu não me leio, não me entendo.

Acho que perdi mesmo a noção do meu tamanho, do meu valor.

Acho que essa sobra de amor, essa miséria de atenção é pouco pra mim... Costumava ser... Deveria ser... Vai ser... Ainda não é.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Pensando sobre o medo

Instinto de sobrevivência vem acompanhado de medo. O medo é fundamental pra que se proteja de situações onde nossa vida pode estar em risco, ou de outros seres. Quando vivíamos em selvas e em cavernas, tendo que fugir de ataques inesperados e tendo que lutar pelas conquistas básicas de subsistência, foi o medo que garantiu que chegássemos vivos até os dias de hoje.

As lutas que travamos na atual sociedade não são as mesmas daquela época, mas ainda possuímos os mesmos medos e instintos de preservação.

Quando uma loba prepara seu filhote pra vida ela o expõe ao perigo algumas vezes para que ele desenvolva o medo e saiba fugir e se defender. Ela aguça o instinto do filhote, e o prepara pra se defender e ser independente.

Quantas vezes ouvimos adultos falando com crianças pelas ruas, ou até dentro da nossa casa: “Não faz isso que o moço briga!” “não vai lá que o monstro pega!” “Se não dormir o bicho papão vai te pegar!”... Parece que, no nosso caso, mantemos as crianças “na linha” criando medos desnecessários e assim elas dão menos trabalho. Assim elas não vão além do nosso limite confortável e o medo instintivo da criança delimita o espaço de ação dela e o trabalho que se tem em acompanhar e proteger a criança.

É claro que não estou me referindo aos casos em que a criança está realmente exposta ao perigo.

Uma vez me contaram um caso de um índio que estava fazendo artesanato de barro e seu filho estava do lado mexendo. O índio não falava nada, mesmo sabendo que uma criança estava segurando um objeto quebrável. Claro que o objeto caiu e quebrou. O índio nada falou. Perguntaram pra ele o porquê dele não ter falado nada e ele respondeu: “agora ele sabe que quebra.”

Mesmo não vivendo mais em cavernas e entre bichos selvagens, parece que preparamos nossos filhotes pra serem presas ou predadores. Ou com excesso de ingenuidade ou com requintes de esperteza. Mas em todos os casos o medo continua presente dentro de todos nós.

Não é à toa que a síndrome do pânico se instalou no nosso século, atingindo todas as camadas da nossa sociedade, independente de classes. Talvez estejamos lutando contra inimigos ocultos de todos os lados, e nos sintamos como “cegos em tiroteio”, acuados, sem saber o que fazer ou como se defender.

“Ter medo é ser fraco”, é assim que aprendemos. Se nos deparamos com algo que gera medo, a atitude comum é fingir que ele não existe e “bola pra frente” “enfrentemos nossos medos e seremos vencedores”... Mas o medo existe e não é racional, é instintivo. Se ele não é respeitado pode crescer desmedidamente e se tornar um monstro gigante, aí passamos a ter medo do próprio medo. Aí o medo te faz paralisar diante de você mesmo.

Temos medo da morte e é esse medo que faz com que continuemos vivos. A natureza é sábia! Se aceitarmos que o medo é natural e é uma coisa boa, talvez ele jogue no nosso time. Se respeitarmos o direito que o outro tem de temer algo, mesmo que pra você seja bobo, passaremos a conviver com o medo de uma forma mais pacífica.

Talvez...